INTRODUCÇÃO

 

 

 O que é aquilo que em fim obriga a um homem de escolher o seu próprio caminho e assim sair fora da identidade inconsciente com a multidão, como de um nevoeiro? Isso não pode ser necessidade porque ela oprime a muitos que se salvam nos costumes. Isso não pode ser a escolha moral porque o homem normalmente decide a favor dos costumes, Portanto, o que é que decide, de forma inevitável, a favor de uma coisa extraordinária? É aquela determinação interior, o factor irracional que sendo o destino obriga à emancipação do gado e dos seus caminhos bem conhecidos. A verdadeira personalidade tem sempre uma determinação interior e acredita nela; tem a “pistis” (confiança, fé) nela, como em Deus, embora que um homem comum dissese que aquilo era só a sensação individual de ele ser enviado. Mas essa determinação interior efectua-se como a lei de Deus, ao qual não se pode faltar. A realidade de que muitos morrem no  caminho não tem significação nenhuma para aquele que se sente enviado no seu interior. Ele tem que ser fiel a sua própria lei como se ela fosse um demônio que lhe diz ao ouvido os caminhos novos e extraordinários. Quem tem missão, quem escuta a voz interior, ele é escolhido.

 

C. G. Jung

  

 

É indiscutível que o Ayrton Senna foi escolhido. Seguiu a sua missão até o último momento, até aquele dia 1 de Maio de 1994, incompreensível para muitos. Ficou fiel à voz interior dele e à lei divina, a qual o obrigou de compartir o inteiro ser dele com os milhões de pessoas no mundo. Literalmente tinha oferecido a si próprio até a última gota de sangue, o aluno digno do seu Mestre.

 

Não é costume aplicar metáforas deste tipo a uma pessoa do mundo do desporto. Ai tem heróis, ídolos, pessoas que até são capazes de sacrificar a vida deles para obter o melhor resultado, e todos são pessoas especiais com os motivos que se podem compreender. O Ayrton Senna foi tudo isso no sentido desportivo, mas foi também um pouco mais; o Ayrton continua a ser um pouco mais. O seu poder humano, coração tenro e fé ao próprio ser criaron a excepcionalidade que sobreviveu a morte física dele. É por causa disso que a memória que hoje temos dele não é nem unilateral nem formal. A personalidade forte dele tem influenciado muitos, e acredito que para eles, como para mim, ele voltou a ser um exemplo de como deviamos viver, porque um homem não se cria com palavras, senão com exemplos, e o Ayrton sabia-o.

 

Queria dar uma prova concreta que realmente podemos mover os nossos limites, que esta força, que podemos encontrar em nós, nos dá a possibilidade de ficarmos melhores constantemente” - foram os pensamentos dele.

 

É conhecido que ele encontrou a força dele em fé. Como? Isso já é menos conhecido. “Acho que aquilo que está escrito na Bíblia é uma coisa muito séria, palavra por palavra, e eu tento compreender a vida através de Deus” -disse. Foi assim que ele fazia tudo, com fé e consistência.

Quando tinha monido, muitos suspiraram: “Meu Deus, tinha só 34 anos, e isso era a idade de Jesus.”

  

 

Se quisermos compreender a actitude do Ayrton para com a vida, absolutamente temos que ouvir as mensagens de Jesus. Não de forma como elas nos são apresentadas pelas distintas comunidades religiosas inúteis, mas de forma como o exigia o próprio Jesus: “Dou-lhes um exemplo” - disse. O Ayrton seguia esse exemplo e fez-se um exemplo para outras pessoas; foi um daqueles que compreenderam bem os mandamentos de Deus: não apenas as palavras, obras! Por isso cada tentativa diferente de explicar a personalidade do Ayrton Senna, sem considerar este facto clave, leva sempre até a perda em contradições, e foi por isso que aqui tentei explicar a vida dele assim como ele a vivia - em comunidade com Deus, com quem falava em público, diante de todos, vivendo cada dia segundo as leis dele. A devoção dele não foi fingida, ele rezava a Deus com obras, a toda hora.

 

Ao escrever esta história do Ayrton (deixando a palavra principal ao próprio Ayrton e por isso isto é a história dele) a música acompanhava-me o tempo inteiro, de forma que este breve resume da vida de Ayrton Senna tem um fundo musical. A música é um meio muito poderoso, a língua misteriosa da experiência universal da realidade, e ouvindo o grande artista Freddie Mercury (Ayrton Senna gostava muito da música dele*), eu encontrava as palavras com mais facilidade, para descrever a profundidade da alma do amigo ausente e divulgar a mensagem que ele nos dirigiu. Por isso ouçam obrigatóriamente as canções de Freddie Mercury, porque elas não são uma moda, nem passageiras, foram cantadas para trovoar com toda a força; elas também são as mensagens dirigidas aos milhões, criadas para continuarem.

 

* Tinha poucos favoritos – do livro da Adriane Galisteu ficamos sabendo que (além da música clássica) gostava mais do Phil Collins, da Tina Turner e do Freddie Mercury.